sexta-feira, 23 de março de 2007

Estudo do “Credo Apostólico” 05

PARÓQUIA N. S. DO PERPÉTUO SOCORRO

Curso: Estudo do “Credo Apostólico”
Expositor: Prof. Paulo Ueti (5 encontros)
Notas Avulsas

5º Encontro(final): 10/04/2006, 2ª feira (16h10 às 18h)

1. Estamos num momento propício, no início da semana santa, para fazer a reflexão sobre o último capítulo do Credo. Segundo o texto do símbolo niceno-constantinopolitano, temos:
“Creio no Espírito Santo,
Senhor que dá a vida
e procede do Pai e do Filho,
e com o Pai e o Filho
é adorado e glorificado:
Ele que falou pelos profetas.”
2. Crer em Deus significa crer e lutar pela vida das pessoas, que muitas vezes estão em situação pior do que nós, em mais graves dificuldades.
3. Somos santos? É bom ver o exemplo de Santo Agostinho, que teve vida desregrada e desarrumada. Mesmo assim, seguiu o caminho da santidade. O que nos torna santo é o batismo. Santo quer dizer consagrado. Com o batismo, todos nós entramos no caminho da santidade. É seguir a recomendação do Levítico: “sede santo, como só Deus é santo.” O batismo, pela ação do Espírito Santo, nos coloca nesse caminho, nessa rota da santidade. Todos nós, pois, podemos nos considerar santos, percorrendo o caminho da santidade.
4. Isso não quer dizer que fiquemos parados, estáticos. Devemos estar em movimento, em aperfeiçoamento. O Espírito Santo habita nos santos. O nosso corpo é templo do Espírito Santo, como diz São Paulo. É preciso acreditar na comunhão dos santos, não só dos santos que já foram e que estão na glória, mas também dos que estão aqui na comunidade, membros da Igreja.
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5. São João: fala-se com Deus através dos irmãos, na comunidade. É a confirmação de que o amor a Deus passa pela comunhão dos irmãos.
6. Retomar a história do bom samaritano: o próximo foi aquele que tocou no necessitado, cuidou dele, assistiu-o na sua carência e dificuldade, atendeu-o inclusive com dinheiro, nos gastos indispensáveis.
7. A semana santa é, pois, momento apropriado para repensar como estamos no curso da nossa espiritualidade.
8. Foi colocada a pergunta: quem fundou a Igreja? O Espírito Santo fundou a Igreja, por ocasião do Pentecostes. Ele continua na Igreja, atuando, agindo. Ele é o mantenedor da comunhão: reza-se ao Pai, reza-se ao Filho, na comunhão do Espírito Santo. Ele fala através da nossa materialidade, na convivência das pessoas e com o ambiente, com a natureza.
9. Foi lembrado que, mesmo depois que se morre, temos que ter corpo. Jesus Cristo, depois que ressuscitou, aparece com o corpo.
10. Prosseguindo:
“Creio na Igreja,
una, santa, católica e apostólica.”
* Una: unida nas diferenças, nos projetos, nos sentimentos. O Espírito Santo suscita diferentes carismas. A Igreja deve ser unida nas coisas que são essenciais. Em relação aos protestantes, essa união aparece na crença em Jesus, na Trindade, na comunhão dos santos, na Bíblia. As diferenças são relativamente poucas e ocorrem nitidamente quanto aos sacramentos e no que se refere aos santos. O importante é ter em conta o fundamental: a Igreja, a comunhão, a missão, a liturgia, a diversidade nos sacramentos. O batismo nos insere na comunhão da Igreja;
* Santa: a Igreja é santa. Permanecer na comunhão ajuda no caminho da santidade. Leonardo Boff: “é melhor errar com a Igreja do que errar sozinho”;
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* Católica: a Igreja é universal. Presente para o mundo e está presente em todo o mundo. As sementes do Verbo, do Espírito. Não se leva Deus para lugar nenhum: Ele já está! Nós aceitamos Jesus, mas não o levamos. A Igreja é católica, universal, para todos. Ela é holística: é para todo o mundo, todos têm espaço. Por tradição, somos muito abertos na religião católica;
* Apostólica: a Igreja é missionária. A missão não é a de encher os bancos e as cadeiras, nem a de construir mais templos. A missão é aquela ensinada e mostrada por Jesus: curar os doentes, incluir os excluídos, exercer a misericórdia no mundo. Quem estiver fora, excluído, deve ser ajudado a se integrar.
* A unidade e a santidade são qualidades internas, para dentro da Igreja. Todos nós devemos procurar ter ações internas e também para fora da Igreja. Não é preciso saber falar, se expressar bem: mesmo de boca fechada, a gente pode ajudar. De modo geral, os católicos têm pouca presença nos hospitais e nas cadeias. É preciso desenvolver o apostolado.
11. Dando continuidade ao Credo:
“Professo um só batismo
para a remissão dos pecados.”
12. O pecado não tem poder sobre a graça. A graça é maior que o pecado, é mais forte. O batismo redime os pecados, que perdem poder sobre o nosso corpo, sobre o nosso espírito.
13. Indagado sobre o batismo de Jesus, explicou o Prof. Paulo Ueti que se tratava de um rito de passagem, uma iniciação. Jesus precisava participar do grupo de João Batista, que pertencia ao grupo dos profetas. Já o batismo do Espírito Santo é a própria cruz de Jesus. É mais fundamental.
14. Quanto à questão relacionada com a obrigação de pagar pelas faltas, pelos pecados, e que é frequentemente colocada pelas pessoas, disse o Prof. Paulo Ueti que não faz sentido pautar a nossa religião por negociações e manipulações. O fato essencial é que ganhamos a graça de Deus como presente. Na verdade, nós temos responsabilidade pela graça que recebemos e que temos de distribuir com os outros. Cabe a nós passar adiante o amor que nos é dado de graça por Deus.
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15. Quanto às indulgências, é questão que vem pela tradição, pela Patrística. Trata-se de assunto complexo, que tem a ver com a história da Igreja e que deve ser aprofundado por cada um de nós.
16. A tradição religiosa da nossa Igreja compreende, pois, a unidade, a santidade, a catolicidade, o apostolado. Nós somos responsáveis por esse conjunto, mas isso não deve ser condicionamento. Não dá para ficar de braços cruzados, sendo necessário distribuir o amor, a graça que recebemos de presente. É preciso acreditar que efetivamente os pecados vão ser redimidos.
17. Final do Credo:
“E espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo que há de vir. Amém.”
18. São, de fato, dois momentos que se juntam. Ninguém fica lá: Jesus foi ressuscitado e subiu para junto de Deus, na comunhão plena, na vida eterna.
19. Eu já experimento, aqui, a vida eterna, através dos sacramentos, que são “sinais sensíveis e eficazes da graça de Deus.” Essa é a vida eterna que começa agora.
20. Na comunidade, fazemos a experiência da partilha. Podemos viver o ambiente da alegria de todos, pela comunhão. Precisamos nos descontaminar, com apoio na oração; fazer as coisas juntos; conviver; suportar-nos uns aos outros. Isso é o sacramento do Reino, assumindo a preocupação pelos outros.
Intervalo: 17h05 às 17h25
21. Retomando o curso e, para encerrá-lo, o Prof. Paulo Ueti colocou-se à disposição para perguntas e esclarecimentos.
22. Entre outras questões, esclareceu e informou:
a) quanto ao batismo do Espírito Santo de Jesus, afirmou que existe apenas um batismo – único e de uma vez por todas. O batismo unifica a gente. Quando se é batizado, a gente se prega na cruz com Jesus;
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b) sobre o sofrimento, disse que nascer já é um evento traumatizante: trauma da separação umbilical, separação da proteção do útero. A primeira grande separação é, pois, a decorrente do corte umbilical. A segunda separação traumática é o desmamar. Os homens, em particular, vão sofrer mais, na medida em que, na adolescência, perdem o contato com o pai. Os homens são mais brutalizados, mais introspectivos. Uma questão relevante é examinar como ajudar homens e mulheres a serem menos traumatizados e mais humanizados;
c) nesse contexto, um problema sério da religião é o da separação. Só que ela não precisa ser traumática. A Igreja precisa ser uma família para poder integrar e para que não se perca essa integração;
d) a comunidade religiosa é, às vezes, um peso. As pessoas precisam ser ajudadas a entender, e até mesmo a sair, de modo a encontrar o seu caminho;
e) no tocante à indagação sobre como entender “ter vida e vida em abundância” num contexto de cruz, o Prof. Paulo Ueti iniciou explicando que o correto, quando se fala do crucifixo, é ter em conta que o símbolo é a cruz (sem o corpo de Jesus). A expressão “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?” mostra que Jesus se sentiu abandonado. A cruz é o lugar do abandono, do cúmulo do sofrimento. A cruz é também o lugar da ressurreição: ela se dá na cruz e através da cruz. Jesus disse: nós viemos para ter vida e vida em abundância. É preciso que haja o atrito, o choque. Não podemos ficar à deriva da morte, como ocorre com os pobres da favela, que não têm direito à vida (a eles é negado esse direito). Precisamos nos dar conta de que muitas pessoas na sociedade têm mais vida e oportunidades do que outras. O sofrimento existe para todos. Na plenitude dos tempos, ou seja, na glória, no final dos tempos, tudo será mais perfeito. Mas não podemos fugir da realidade do mundo, pois é aqui que Deus se revela. A cruz de Jesus está no centro da nossa vida. Na ressurreição, Jesus está fora da cruz.
Brasília, 10/04/2006
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Estudo do “Credo Apostólico” 01

PARÓQUIA N. S. DO PERPÉTUO SOCORRO
Curso: Estudo do “Credo Apostólico”
Expositor: Prof. Paulo Ueti
(5 encontros)
Notas Avulsas
1º Encontro: 13/3/2006, 2ª feira (16h07 às 18h05)
O Prof. Paulo Ueti iniciou o curso com a leitura e algumas
reflexões sobre o Salmo 130 (129), “De profundis”:
Salmo 130(129)
“Das profundezas clamo a ti, Javé:
Senhor, ouve o meu grito!
Que teus ouvidos estejam atentos
ao meu pedido por graça!
Se fazes conta das culpas, Javé,
Senhor, quem poderá se manter?
Mas contigo está o perdão,
para que sejas temido.
Eu espero, Javé, eu espero com toda a minha alma,
esperando tua palavra;
minha alma aguarda o Senhor
mais que os guardas pela aurora.
Mais que os guardas pela aurora
aguarde Israel a Javé,
pois com Javé está o amor,
e redenção em abundância:
ele resgatará Israel
de suas iniqüidades todas.”
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O Salmo lembra o Deus verdadeiro, que não é mágico,
poderoso no sentido humano, mas libertador e bondoso.O Salmo procura recuperar a imagem perdida de Deus, o Deus de Amor. É o salmo por excelência da quaresma: Salmo penitente, mas não de sofrimento e fortemente afirmativo. Mostra quem é Deus: é nele que está o perdão, o amor, a redenção em abundância. O sofrimento não é grande coisa , é só o sofrimento; cometer erros é só cometer erros; as nossas bobagens são apenas as nossas bobagens.
A conversa prevista no curso sobre o “Credo Apostólico”-
os dois credos, o credo símbolo dos apóstolos e o credo símbolo niceno-constantinopolitano – terá por base a pergunta essencial: “Quem é Deus?”
Há quem imagine que o sofrimento é obra de Deus, vem
de Deus. É preciso desfazer essa idéia equivocada e, pela nossa profissão de fé, por meio do Credo, identificar pelo menos quem não é Deus.
O Prof. Paulo Ueti relembrou o retiro de que participou
com jovens, em que um deles, indagado sobre quem é Deus, procurou explicar que Deus seria como um velhinho que tinha dois cachorros bravos e ameaçava soltá-los sobre as pessoas.O tempo da conversão seria aquele disponível até que um dos cachorros chegasse até nós. Para alguns, pois, Deus é distante, rancoroso, faz acepção de pessoas, acena com ameaças.
Quanto ao sofrimento, é bom ter em conta que ele faz parte
da vida, da humanidade: não existe o ser humano sem sofrimento. Além disso, para cada um de nós, Deus é o centro da nossa fé: Ele não nos faz sofrer. Muitas das nossas mazelas nada têm a ver com Deus. A pobreza existente no mundo, por exemplo, não vem de Deus: nós não sabemos repartir! Deus nos faz perceber que as escolhas que fazemos muitas vezes não estão de acordo com a vontade do Pai. Deus está entre nós, mas depende de nós saber percebê-lo.
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Uma questão essencial é saber se a graça de Deus muda a
minha vida, ou não. Foi relembrada a história do evangelho, envolvendo Maria e Marta: quando Jesus ia à casa delas, observa-se que Maria largava tudo o que fazia para ouvir Jesus e ficar com ele. A presença de Jesus não mudou, porém, a rotina de Marta, que continuava assoberbada com os afazeres domésticos e reclamava a falta de ajuda de Maria. Esta, ao contrário, escolheu a melhor parte: a presença de Jesus mudou a sua rotina.
A afirmação de fé tem a ver com isso: a presença de Jesus
em minha vida modifica a minha rotina? A minha profissão de fé muda minha vida?
A imagem de Deus, portanto, está em jogo. Quem é Deus?
Qual a imagem de Deus que tenho segundo a minha fé?
10. O nosso encontro com Deus deve ser marcante. É só lembrar a história do samaritano misericordioso e perceber que o amor de Deus é pleno e não impõe condições. Deus é amor primeiro. Eu amo porque Deus me ama. Eu tenho que experimentar o amor de Deus. A nossa religião, a religião católica, não é a religião do mérito individual. Deus nos ama primeiro. O critério de Deus é a sua necessidade. A graça de Deus é pública, amorosa e incondicional. Um bom exemplo é o do patrão que foi em busca de operários durante o dia, em horários diferentes, e, no final, realizou o pagamento da diária a partir do último contratado, atribuindo-lhe o mesmo valor que havia acertado com o primeiro.
11. É preciso estarmos atentos e não cair na armadilha de cumprir o rito da missa, sem atender à essência religiosa; cumprir a lei e esquecer a graça de Deus, que justifica o Credo. É preciso relativizar a norma, estabelecer prioridades. Rezar por rezar não resolve: urge viver a religião, cumprindo naturalmente as normas.
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12. As obras são conseqüência da fé. Os milagres dependem da fé. Cabe viver na fé a profissão do Credo.
13. Deus é todo-poderoso. Só que o poder de Deus não é o imaginado pelos discípulos. Deus é o Messias que vai morrer na cruz!
14. Não se trata simplesmente de cumprir o rito da fé. É preciso ter conteúdo na fé. É preciso aprofundar a nossa fé. Temos que conviver e encarar o mistério, mesmo sem definí-lo, sem saber explicá-lo. Mistério não segredo. É preciso mergulhar no mistério.
15. São Tomás de Aquino: a respeito de Deus, só podemos dizer o que Ele não é.
16. Nós podemos dizer uma palavra sobre Deus, mas não a palavra sobre Deus. Deus é amor, é misericórdia. Deus não é mentiroso, não é carrasco, não é sofrimento.
17. O Credo Apostólico é uma afirmação de fé, mas não pretende dizer quem é Deus. Crer é viver. Crer na Bíblia é fazer. Mudar de vida de acordo com Jesus. Procurar parecer com Jesus.
18. Com base no Credo, a pergunta é: a minha fé me fez parecer com Jesus e acreditar nele? É preciso, através do Credo Apostólico, me transformar e ficar parecido com Jesus. Eu leio a Bíblia para parecer com Jesus.
19. A revelação de Deus para nós cristãos, não está na Tradição, nem na Patrística, nem na Bíblia, mas sim na pessoa de Jesus Cristo – um ser humano que é para nós, cristãos, a revelação de Deus. As outras religiões monoteístas, como o Islamismo e o Judaísmo têm, como revelação de Deus, o Corão e a Torá.
20. O Credo nos ajuda a rever a nossa imagem do Deus da Bíblia.
O Credo nasceu no IV século. Até então, não havia o Credo, pois não havia necessidade, uma vez que tudo era tranqüilo e fora de dúvida. As transformações havidas levaram à necessidade de retomar a origem das coisas, considerando que os quatro primeiros séculos mudaram muito a Igreja, requerendo a necessidade do Credo.
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21. O texto de Jó é ilustrativo, na medida em que mostra que os seus amigos religiosos vão dizer que conhecem Deus e que Jó está sofrendo porque pecou. O mesmo que se vê quando uma moça é violentada e se diz que a culpa é dela, porque anda com pouca roupa, se expondo. Para os amigos de Jó, a razão é que Deus castiga os pecadores e a culpa é dele, pecador. Jó, destemidamente, nega tudo isso.
22. Deus é maior que a minha capacidade de compreendê-lo.
Intervalo: 17h15 às 17h32
23. Após o intervalo, o Prof. Paulo Ueti indicou a leitura e a reflexão sobre o texto da Epístola aos Filipenses, a partir do capítulo 2, versículo 5 e seguintes:
“Tende em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus;
Ele, estando na forma de Deus,
não usou de seu direito de ser tratado como um deus,
mas se despojou, tomando a forma de escravo.
Tornando-se semelhante aos homens e
reconhecido em seu aspecto como um homem abaixou-se,
tornando-se obediente até a morte,
à morte sobre uma cruz.”
24. É requerido que se tenha o mesmo sentimento que havia em Jesus. Parecer com Jesus. Não esquecer quem é Jesus.
25. Jesus tinha a condição divina e não se vangloriou disso. Foi gente como nós, plenamente. Jesus esvaziou-se de si mesmo, desapegou-se, assumiu a condição de servo, tomando a semelhança humana. Humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte, a morte de cruz. Obediente significa diálogo, significa escutar (de dentro, do fundo do coração) e praticar a vontade de Deus.
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26. Temos medo da cruz. Escutar é ir para o sacrifício da cruz. Termina na cruz, mas não significa ficar na cruz.
27. Jesus foi para a cruz. Parecer com Ele é também seguir o caminho da cruz. Não vamos esquecer que o “kit Jesus” é completo: vida, sofrimento, morte, ressurreição. Tudo acaba na cruz, que vira ressurreição.
28. Jesus não pede o sofrimento, que é resultado do seu amor pela humanidade. Fazer o mundo melhor causa sofrimento. A cruz faz parte da nossa fé.
29. Cabe a cada um de nós perceber a graça de Deus misturada com o sofrimento da humanidade. Tudo está junto e misturado.
30. A vida tem que ter método. Aprende-se isso no cotidiano do exercício da vida. Praticar o sofrimento. A religião é um caminho.
Caminhar com Jesus. A cruz está no caminho.
31. O Credo é fundamental para entender que a felicidade e a tristeza podem conviver na mesma mesa. A rigor, percebe-se que elas são a mesa: vivem juntas, fazem parte da vida!
32. Onde é o lugar de Deus? Qualquer lugar. Deus está em todos os lugares.
33. Nos próximos encontros, serão vistos e detalhados os 3 artigos essenciais dos dois Credos, o Credo Apostólico e o Credo Niceno-Constantinapolitano.
Brasília, 14/3/2006.
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sábado, 10 de março de 2007

RETIRO ESPIRITUAL: DEUS É AMOR


Data: 10/03/2007 (sábado)
Horário: 8 às 17h35
Pregador: Pe. Rafael Vieira
Local: Paróquia N. S. Perpétuo Socorro
Auditório Totus Tuus
Notas Avulsas

1. O encontro teve início com o terço, entre 8 e 8h30, registrando-se a inscrição de 148 participantes. O Pe. Rafael, às 8h32, assinalou que se tratava de oportunidade valiosa para rezar juntos, no convívio de uma comunidade para ele muito querida, onde trabalhou por vários anos e conquistou muitos amigos. Disse estar enfrentando problema de saúde nos últimos dias, com o registro de dor permanente, a despeito do uso de analgésicos e do colar de apoio no pescoço. Em tom de brincadeira, mencionou que o seu problema de saúde tinha nome pomposo: discopatia degenerativa cervical difusa.
2. Logo em seguida, o Pe. Abdon Guimarães, Pároco, apresentou-se com o Santíssimo Sacramento, ministrando a benção aos participantes.
3. Dando início à sua apresentação na primeira parte de reflexão para o retiro, conforme agenda distribuída, o Pe. Rafael teceu as seguintes considerações básicas:
a) indicou que o retiro é forma de oração com características sofisticadas, não sendo fácil de ser executado. Quando se olha, por exemplo, para os textos do Novo Testamento, fica parecendo que só Jesus fazia retiro, que requer disposição espiritual especial;
b) o retiro depende cerca de 70% dos participantes, de quem está fazendo o retiro, e não mais de 30% do pregador. Por isso, retiro bom é sempre aquele que é norteado pelos participantes;
c) o retiro não é só para ouvir a palestra. É o tempo que tomamos para nós, com a ajuda do pregador. Ele depende basicamente dos participantes: a parte do pregador é apenas complementar;
d) o retiro tradicional cristão tem características especiais importantes:
- fazer silêncio;
- estar com espírito de oração permanente: ninguém está dispensado de espírito de oração, ou seja, corações e mentes deverão estar abertos, para que o Espírito Santo possa agir em nós.
4. Para o retiro de hoje, manifestou o Pe. Rafael o desejo de fazer um pacto, escolhendo juntos alguns sinais. Como o tema será DEUS É AMOR, propôs à assembléia acordo para escolher a forma de amor que simbolizasse o dia inteiro. Como um sinal, sugeriu o amor fraternal, no sentido de ficarmos iguais de ponta a ponta. Como consequência prática disso, caberia a cada participante mudar de lugar após cada um dos intervalos, no retorno ao auditório. A idéia seria, pois, priorizar o amor fraterno.
5. O segundo sinal seria um gesto de coragem amorosa: sentar no lugar diferente, sem escolher o parceiro. É preciso sair da zona de segurança e tomar a coragem amorosa.
6. O terceiro sinal seria um ato de adesão ao retiro. Quando cada participante for para o tempo de interiorização, fora da palestra, não conversar sobre aquilo que não for preciso.
7. O quarto sinal seria sinal de paz interior: é a disposição de ficar sozinho, sem se aglomerar e formar grupos.
8. Enfatizou o palestrante que, no ato da inscrição, cada um já manifestou a vontade de fazer o retiro. Mas é necessário trabalhar a vontade, para não deixa-la ir diminuindo de intensidade. Precisamos cultivar a vontade. Por exemplo, se houver desapontamento com a primeira exposição do dia, cabe cuidar dos outros aspectos do retiro, cultivando a vontade nessa direção.
9. O retiro depende muito da nossa capacidade de disciplina: é preciso exercitá-la. Tomar como exemplo o retiro dos Inacianos, com duração de trinta dias.
10. Foi lembrada ainda a questão do prazer. Cada um sabe a forma de conduzir a sua satisfação. É preciso abrir os ouvidos, aquecer o coração, estimular a cabeça. Tudo fica seguro com Deus agindo sobre nós. Quem renuncia ao prazer, renuncia a viver. É preciso explorar as potencialidades do prazer.
11. Considerar também, no retiro de hoje, o aspecto da clareza. Ouvir o outro é geralmente um sacrifício, pois nem sempre entendemos o que o outro diz.
12. O retiro é ocasião para encontros intrapessoais com os outros e com Deus. Foi lembrado o intenso diálogo intrapessoal de Jesus no processo da paixão, no Getsâmini, quando chegou a suar sangue: “Pai, afasta de mim este cálice”. Jesus estava no auge da pressão emocional, mudo, tenso, cheio de pavor, digerindo o problema.
13. Necessidade de, no retiro, realizar o encontro de cada um consigo mesmo. Foram lembradas as dificuldades para proporcionar esses encontros pessoais. Vivemos, muitas vezes, a perda da nossa integridade, estamos indo aos pedaços: é preciso pegar os cacos e juntar tudo. Aproveitar, no retiro, para fazer o reencontro consigo mesmo, chegar às falas, juntar os pedaços.
14. Retomando o tema do encontro – DEUS É AMOR – explicou o Pe. Rafael que tudo começou lá atrás, com a revelação de Deus no Antigo Testamento, quando Deus fez nascer a fé em Abraão, primeiro patriarca. É o gesto de amor de Deus, assegurando a descendência de Abraão, saindo de si e indo até o patriarca para firmar a Aliança: vê-se o encontro com Abraão, sob a forma de pessoa vestida de branco. É um importante gesto de amor, entre Deus e Abraão, fazendo brotar a fé. O gesto produz a fé. Não vai adiantar querer a fé sem amor.
15. No Antigo Testamento, que é encharcado do amor de Deus, a palavra amor não é vista com freqüência. A palavra é importante, mas é bom ter em conta que o gesto efetivo de amor é o mais relevante.
16. O Novo Testamento revela a chegada do amor encarnado. O evangelho de São João, o último dos evangelhos, no capítulo 15, diz: “Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos” (Jo 15, 13). Jesus é autoritário e determinado quando fala do seu mandamento, a sua ordem: “O meu mandamento é este: amem-se uns aos outros, assim como eu amei vocês.”
17. O amor é a lei suprema. Os pecados estão perdoados para quem vive o amor. A intensidade da vivência do amor é o que salva ou condena. Mateus nos repassou que quem pratica o amor será bendita.
18. O palestrante mencionou que o mundo viveu, cerca de dois anos atrás, a perda de um dos homens mais iluminados da Igreja recente, o Papa João Paulo II. Ele fez do seu sofrimento o maior ensinamento para todos nós. Nessa época, ele, Pe. Rafael, foi incumbido de fazer a cobertura do funeral do Papa, em Roma. Ao seu ver, vai demorar muito tempo para que o mundo possa rever a beleza e dramaticidade das cenas vistas: eram filas enormes, de 10, 12, 14 horas para a oportunidade de passar diante do corpo do Papa João Paulo II. Foi um evento verdadeiramente planetário, em que o mundo de ponta a ponta olhou para a Praça do Vaticano. Tratava-se de homenagear um homem que deu um testemunho colossal de amor.
19. Seguiu-se a Semana do Conclave e das expectativas em relação à eleição do novo Sumo Pontífice. Aos poucos, ia surgindo um nome, o de Joseph Ratzinger, que causava arrepios à grande maioria das pessoas. A sua história tinha sido conflituosa em relação a variadas partes do mundo: América Latina (rejeição da Teologia da Libertação); Ásia (condenação de bispo chinês). O certo é que o Conclave foi se afunilando e o resultado final chegou ao seu nome. Observa-se que, apesar da tradição anterior conflitiva, o atual Papa Bento XVI parece uma criança quando fala, sempre doce e delicado. Foi impressionante a sua homilia na missa de corpo presente do Papa João Paulo II, revelando o seu profundo conteúdo.
20. No Brasil, a repercussão na mídia foi através de manchetes negativas e pessimistas, com a expectativa de um Papa de estilo mão-de-ferro. Daí, a grande surpresa e o impacto pelo lançamento, logo no início do seu mandato, da sua primeira Encíclica: “Deus Caritas Est”.
21. Trata-se de texto delicioso! Verdadeiramente, um documento corajoso, em que pela primeira vez a Igreja Católica falou de forma direta sobre o valor do amor sexual. Segundo o Pe. Rafael, recomenda-se vivamente a sua leitura: “Leiam e saboreiem o texto da Encíclica.”
22. Com a Encíclica, o Pe. Rafael aprendeu, segundo disse, o caminho para a proposta de retiro de hoje, com a escolha de quatro verbos significativos:
1º) expandir: amar é ultrapassar fronteiras. Ir além da gente: sair de si, expandir, ou seja, fazer algo que é da natureza do amor de Deus;
2º) dialogar: expandir e encontrar o outro, com ele dialogando; exercício de aprendizagem;
3º) aprender;
4º) reconciliar.
23. Nessa altura, e acentuando que reconciliar é a culminância, o Pe. Rafael convidou a todos para se deliciarem, com aperitivo, de trecho da Encíclica do Papa Bento XVI. Escolheu o item nº 17, a saber:
“17. Com efeito, ninguém jamais viu a Deus tal como ele é em Si mesmo. E, contudo, Deus não nos é totalmente invisível, não se deixou ficar pura e simplesmente inacessível a nós. Deus amou-nos primeiro – diz a Carta de João citada (cf. 4,10) – e este amor de Deus apareceu no meio de nós, fez-se visível quando Ele “enviou o seu Filho unigênito ao mundo para que, por Ele, vivamos” (1 Jo 4,9). Deus fez-Se visível: em Jesus, podemos ver o Pai (cf. Jo 14,9). Existe, com efeito, uma múltipla visibilidade de Deus. Na história de amor que a Bíblia nos narra, Ele vem ao nosso encontro, procura conquistar-nos – até a última Ceia, até o Coração trespassado na cruz, até as aparições do Ressuscitado e as grandes obras pelas quais Ele, através da ação dos Apóstolos, guiou o caminho da Igreja nascente. Também na sucessiva história da Igreja, o Senhor não esteve ausente: incessantemente vem ao nosso encontro por meio de homens nos quais Ele se revela; por meio de sua Palavra, nos Sacramentos, especialmente na Eucaristia. Na liturgia da Igreja, em sua oração, na comunidade viva dos crentes, experimentamos o amor de Deus, sentimos sua presença e aprendemos desse modo também a reconhecê-la em nossa vida cotidiana. Ele amou-nos primeiro e continua a ser o primeiro a amar-nos; por isso, também nós podemos responder com o amor. Deus não nos ordena um sentimento que possamos suscitar em nós mesmos. Ele ama-nos, faz-nos ver e experimentar seu amor, e desta “antecipação” de Deus pode, como resposta, despontar também em nós o amor.”
24. Em seguida, o Pe. Rafael teceu comentários sobre o verbo expandir e as suas implicações. Explicou que Deus tomou a iniciativa e veio ao nosso encontro. Numa situação confortável, a tendência é nos acomodarmos. Ela nos impede de sair, ir adiante. Conviria, pois, refletir sobre as situações reais de conforto e desconforto, sabendo que existem algumas características que reforçam o conforto, como é o caso do dinheiro e das condições materiais sólidas.
25. Foi mencionado que os confortos espirituais às vezes deixam as pessoas pouco amorosas. Afigura-se complicado o encontro na direção do outro cheio de problemas. A expansão nesse caso é sair da região do conforto espiritual. É difícil fazer isso: sair da nossa situação de conforto para ir ao encontro do outro. Em geral, não queremos sair da nossa zona de conforto e ficamos com pouca prática amorosa.
26. A doença nos coloca numa situação de desconforto absoluto. É sempre bom avaliar qual a qualidade do nosso conforto. A gente começa a reclamar de tudo e faz cobranças. Nas zonas de desconforto espiritual, as saídas são pouco amorosas e, pior que tudo, são saídas erradas.
27. As situações de desconforto material, por sua vez, levam a saídas muitas vezes revoltadas, rancorosas.
28. Na experiência oriental, fala-se do momento sublime da iluminação, o despertar. O sair de si, expandir, pode corresponder ao despertar dos orientais. Foi citada, a título de exemplo, a experiência de um grupo de pessoas de Fortaleza, inicialmente 6 e hoje com mais de 60 pessoas, que se dispuseram, voluntariamente, a ajudar doentes terminais nos hospitais, ou com doenças graves, inclusive AIDS.
29. O Pe. Rafael sugeriu, como escolha positiva para a nossa expansão, procurar fazer alguma coisa útil, alguma coisa boa, sem precisar necessariamente contar para os outros.
30. Quem faz algo absolutamente por amor ganha verdadeiramente. São Paulo: viver é Cristo, o resto é resto.
31. A expansão pode nos conduzir ao despertar, à iluminação. Expandir depende do esforço. O exercício da expansão é um trabalho, fruto de empenho.
32. Nós habitualmente não saímos de nós. Não largamos da nossa zona de conforto espiritual. É preciso sair de dentro de nós, ir ao encontro, em busca do outro.
Intervalo: 10h45 às 11h
33. Prosseguindo, ainda, na questão do verbo expandir (em busca do outro), lembrou o Pe. Rafael que a regra de ouro do amor é a não-violência. A não-violência é o símbolo da espiritualidade integral. Jesus foi, ao contrário, vítima da violência.
34. Foi lembrada a recente cena dantesca do Rio de Janeiro em que o garotinho, no assalto à família, foi arrastado pelo carro por cerca de 7 km. Toda a sociedade se chocou e se emocionou com a brutalidade vista.
35. Como católicos, devemos ter visão universal. É uma contradição sermos católicos fechados. Devemos conduzir conosco o selo do ecumenismo: precisamos ir ao encontro do outro porque ele é nosso irmão. Vivemos hoje mais intensamente a experiência da espiritualidade ambiental: não destruir o mundo. Espiritualidade cósmica.
36. Vivemos momento de revisão da nossa realidade. É preciso temos atenção para o fato de que nos conhecemos pouco: em consequência, saímos mal de nós mesmo e saímos errado.
37. Não esquecer de que somos obra-prima de Deus. Não existe ninguém igual a mim. Somos todos diferentes e singulares. É preciso resgatar a crença em nós, resgatar a crença de que somos obra-prima de Deus, sem condições de comparação de um com outro. Ao contrário, erroneamente, passamos a vida toda a nos comparar com os outros, querendo definir quem é o mais santo, o mais humilde, etc.
38. As riquezas que superam as dificuldades estão no nosso próprio coração. A felicidade está dentro de nós. Deus já colocou em nós as coisas de que precisamos para sermos felizes.
39. A sociedade de consumo nos estimula a querer coisas de que não precisamos. O consumo é, nesse sentido, um saco sem fundos. Por razões de baixa auto-estima, somos muitas vezes vítimas de querer o que não é necessário.
40. Por tudo isso, precisamos voltar a reconhecer que somos obra-prima de Deus. Somos produto de qualidade. Não devemos ter medo do outro. As raízes desse quadro tortuoso podem ser identificadas na falta de crença, falta de qualidade e no fato de que temos medo do outro, que é sempre um perigo.
41. Observe-se que as pessoas não falam rigorosamente o mesmo idioma que as outras. Não esquecer também que existe maldade em nós.
42. O Pe. Rafael passou a refletir sobre o segundo verbo: dialogar. Sem diálogo, não há posição de amor. Deus sai de si e vem ao nosso encontro, estabelecendo conosco um diálogo. O diálogo pressupõe diferenças. Ocorrem, porém, vícios nos diálogos, tornando muitas vezes imperativo o monólogo. A arte do diálogo é delicada, colocando em confronto as diferenças. O diálogo profundo só se dá com múltiplos canais de comunicação. O diálogo exige das duas partes a capacidade de se revelar, de se mostrar, e isso é muito arriscado.
43. Deus amou a humanidade porque se revelou. Em relação a nós, não nos damos conta de nos revelarmos completamente. Só damos o “flash”, ou seja, fazemos uma revelação fragmentada.
44. É preciso escutar par dialogar. É preciso ouvir Cristo. Na Transfiguração, vemos a voz do Pai dizer: “Este é o meu filho. Escutai-o”.
45. É preciso despojamento para o diálogo. Nós não temos dialogado muito no nosso amor. Observe-se que amor não é sofrimento. A gente sofre porque não consegue dialogar no amor.
Intervalo: entre 12h e 12h30 (pausa para interiorização); entre 12h30 e 13h45: almoço.
46. O Pe. Rafael retomou a sua apresentação às 14h, mencionando a publicação da Encíclica e falando de que, na Rádio de Goiânia, foram feitas entrevistas para discussão do texto. Falou também da criação do Centro de Convivência para Idosos N. S. Perpétuo Socorro, em Goiânia, com assistência para 140 idosos, desenvolvendo atividades variadas, inclusive terapêuticas. Referiu-se, ainda, a uma pesquisa que promoveu em agosto de 2006 sobre aforismos e frases fortes sobre o amor, tendo resultado na seleção e publicação de livro intitulado “Relâmpagos”, contendo 500 frases positivas sobre o amor, com identificação dos respectivos autores.
47. Seguiu-se a leitura do novo trecho da Encíclica, como segue (item 2):
“2. O amor de Deus por nós é questão fundamental para a vida e apresenta questões decisivas sobre quem é Deus e quem somos nós. A esse propósito, o primeiro obstáculo que encontramos é o problema da linguagem. O termo “amor” tornou-se hoje uma das palavras mais usadas, e mesmo abusadas, à qual associamos significados completamente diferentes. Embora o tema desta Encíclica se concentre na questão da compreensão e da prática do amor na Sagrada Escritura e na Tradição da Igreja, não podemos prescindir pura e simplesmente do significado que esta palavra em nas várias culturas e na linguagem atual. Em primeiro lugar, recordemos o vasto campo semântico da palavra “amor”: fala-se de amor à pátria, amor à profissão, amor entre amigos, amor ao trabalho, amor entre pais e filhos, entre irmãos e familiares, amor ao próximo e amor a Deus. Em toda esta gama de significados, porém, a amor entre o homem e a mulher, no qual concorrem indivisivelmente corpo e alma e se abre ao ser humano uma promessa de felicidade que parece irresistível, sobressai como arquétipo de amor por excelência, de tal modo que, comparados com ele, à primeira vista todos os demais tipos de amor se ofuscam. Surge então a questão: todas as formas de amor, no fim das contas, unificam-se sendo o amor, apesar de toda a diversidade de suas manifestações, em última instância, um só, ou, ao contrário, utilizamos uma mesma palavra para indicar realidades totalmente diferentes?”
48. Voltando ao verbo dialogar, foi dito que é preciso atribuir voto de confiança ao nosso interlocutor, correndo os riscos.
49. Qual o critério que usamos para eleger o nosso interlocutor? É preciso atribuir validade a interlocutores que não tenham, por exemplo, o nosso afeto ou que não estejam necessariamente acostumados a concordar conosco. É preciso atribuir qualidade a quem está conversando conosco. Todas as pessoas têm a sua validade.
50. Caba fazer o discernimento sobre os rótulos. Lembrar que o nosso interlocutor é um passageiro com a mesma natureza nossa e integrante do mesmo barco em que estamos. Ele é também filho amado de Deus e merecedor da atenção de Deus.
51. Naturalmente, não fará sentido falar sobre futebol com quem detesta esse esporte ou sobre teologia com quem não entende essa linguagem. Os diálogos ficariam prejudicados.
52. O diálogo supõe sempre um universo subjetivo que não conseguiremos dominar completamente. É preciso um esforço de humildade para percorrer o diálogo: usar da delicadeza, falar baixo, não assustar o interlocutor. É necessário assimilar o respeito pelo universo subjetivo do interlocutor e distingui-lo dos fatos objetivos. No campo religioso, essa distinção é fundamental: ver a objetividade e a subjetividade, para não comprometer os nossos diálogos. Convém pautar os diálogos por opinião e objetividade.
53. Outra coisa importante: atenção para o calor da discussão. Além disso, abe identificar os fóruns, os ambientes, os momentos em que ocorrem os diálogos. Localizar os momentos e os locais certos.
54. Nas missas, as homilias devem estar ligadas às leituras do dia, consistentemente.
55. Algumas condições indispensáveis para o diálogo:
a) empatia: dar ao outro a atenção que você gostaria de ter. Criar atmosfera pacífica para a interlocução;
b) eleger um propósito, implícita ou explicitamente;
c) manter honestidade ao dialogar, em três sentidos: conosco, com o assunto e com o outro;
d) ter domínio do código que utiliza nos diálogos. Escolher o código adequado com o grau de intimidade e de relacionamento com o interlocutor;
56. O pregador recorreu ao livro “Relâmpagos” e fez a leitura de alguns textos de autoria da escritora brasileira Cláudia Porto.
57. Foi dito que os diálogos verdadeiros vão nos ajudar a percorrer o passo seguinte, relacionado com o terceiro verbo, o verbo aprender. O propósito supremo de todo diálogo é a aprendizagem de parte a parte.
58. Os nossos diálogos nos colocam na escola da vida. Para isso, é preciso que nos confessemos um eterno aprendiz. Nunca se pára de aprender.
59. Na vida espiritual é também assim: aprende-se permanentemente. Aprende-se em cada missa, com cada diálogo Sacramental. Como? Imitando. A imitação é a primeira fase do aprendizado.
60. Foi mencionado o livro “Imitação de Cristo”, tradicional e antigo, mas sempre atual e oferecendo excelente conteúdo.
61. A nossa expressão de amor que vem de Deus passa pela aprendizagem. Convém ir agregando coisas: aprender por imitação e colocar adicionalmente a criatividade.
62. A aprendizagem tem suas regras: não é certo que se aprende tudo o que se escuta. Além disso, há muita coisa que não se precisa aprender. É importante fazer a seleção. Aprender é viver. A vida ensina. É certo que ela nos tira a segurança. A vida dolorosamente ensina.
63. Algumas condições para a aprendizagem:
ser receptivo: não imaginar que já sabe tudo; jogar fora as lentes da resistência: nas Escrituras, por exemplo, muitas passagens difíceis trazem ensinamentos relevantes; é preciso “desembrulhar”;
separar o que é da gente do que é dos outros;
identificar os pavios. Os padres do deserto, dos primeiros séculos do Cristianismo, fizeram a experiência de mergulhar em si para chegar a Deus;
estudar a simpatia e a antipatia: procurar eliminar as entraves emocionais;
ganhar mais abertura, abrindo o leque dos nossos interesses. A abertura para aprender vai gerar vulnerabilidade. Os místicos dizem que você vai sofrer querendo aprender e querendo amar.
Intervalo: 15h35 às 16h
64. Ainda por conta do verbo aprender, observe-se que usamos palavras equivalentes na Igreja. Exemplos: evangelização: ensinar, aprender; catequese (repasse do conteúdo da fé): ensinar, aprender o momento celebrativo: momento também de ensinar, aprender.
65. Na Igreja, vê-se às vezes a falta de ação de conforto espiritual no que se refere à apredizagem. Há, também na Igreja, necessidade da solidariedade no ensino e na aprendizagem.
66. Para aprender, é preciso escolher. Sartre: “Você é o que você escolhe”. Se não fez boa escolha, prepare-se para as conseqüências nefastas. Não existem ações neutras. A escolhe é visceral, é fatal.
67. Temos o costume de delegar escolhas. O problema é que depois reclamamos da nossa delegação do direito de escolha e de que as nossas expectativas não foram satisfeitas.
68. É preciso enfrentar o processo de escolha e não apelar para o regime da magia. Não recorrer, por exemplo, na leitura das Escrituras à escolha de textos aleatórios do Antigo Testamento, tomados isoladamente e fora de contexto, sabendo que o AT corresponde a cerca de 85% do total e o Novo Testamento em o restante, estando aí a mensagem de Jesus encarnado. Ou seja: é preciso fazer sempre a escolha consciente, para não correr o risco enorme de cair na praga conhecida de superstição.
69. Cabe, na nossa vida espiritual, ter bem claro o nosso interesse. E estarmos centrados no ponto essencial: Deus é amor. Não deixar, em cada caso de insegurança e dúvida, de fazer uma investigação corajosa.
70. A título de exemplo, foi lembrada a passagem do Evangelho em que Jesus, acompanhado de grande multidão, é visitado por sua mãe e os irmãos. Jesus foi mal educado e grosseiro? O ponto chave a considerar é o seguinte: Jesus, a encarnação do amor, jamais trataria deselegantemente a sua mãe. Na verdade, Jesus exaltou a mãe, pois era justamente ela quem fazia diligentemente o que o Pai queria, cumprindo a Sua vontade. Não esquecer de que Jesus é a perfeição do amor.
71. Outro exemplo poderia ser identificado no encontro com a mulher fenícia, que pede cura da filha, sem ser ela do grupo dos judeus. Jesus, reproduzindo a tradição dos judeus, disse: não convém tirar o pão dos filhos para jogá-los aos cães. A escolha essencial para entender seria a de que o amor encarnado não chamaria alguém de cachorro. Como se viu, a mulher não era judia e a frase usada era típica dos judeus. Jesus aplaudiu a resposta de mulher quando disse que os cachorros comem as migalhas que sobram das mesas.
72. Vê-se, pois, que quem não escolheu Jesus como a perfeição do amor vai se embaraçar com tais passagens da Bíblia.
73. O palestrante fez menção a um livro que procura apresentar as incongruências entre o Evangelho de João e os três outros evangelhos (Marcos, Mateus e Lucas).
74. É fundamental melhorar a qualidade das nossas escolhas.
75. Prosseguindo, o Pe. Rafael teceu considerações sobre o que se poderia classificar de grandes mestres para a nossa reflexão sobre a aprendizagem:
- a alegria: na prática, ensina muito pouco. A alegria é dispersiva, embora seja uma mestra. O escritor e pensador Teillard Chardin dizia que a alegria é um sinal infalível da presença de Deus. O cuidado é observar que muitas vezes chamamos de alegria o que é apenas uma sensação de frenesi. O nome estaria errado e a sensação pode ser efêmera. A alegria ensina a serenidade. Às vezes, a suposta alegria é apenas um ataque de deboche e não ensina absolutamente nada. É o caso, por exemplo, quando rimos do aleijado e defeituoso, ou nos programas humorísticos correntes. São, na verdade, um esforço medíocre de ridicularização e não ensinam nada;
- a dor: ensina mesmo, ensina de verdade! É uma mestra. As tragédias são incrivelmente pedagógicas. Diferença básica entre a dor e a alegria: aquela ensina de fato, mas às vezes já é tarde demais;
- as lágrimas: ensinam, educam. São expressões de aprendizado forçado;
- as ações: são pedagógicas e ensinam. Há uma diferença grande entre saber e fazer. O que nos leva para a salvação é o fazer. É preciso insistir sempre na ação;
- os fatos da vida: são grandes mestres. Os eventos trazem enormes lições, que são muitas vezes esquecidas rapidamente. Ficam quase descartáveis. Foi mencionado o episódio recente do garoto João Hélio, brutalmente assassinado e que levantou na Sociedade um verdadeira comoção, mas que poderá estar logo logo esquecido. É muito importante tornar-nos conscientes daquilo que estamos fazendo. É preciso fazer bem o que se está fazendo agora. Entrar no presente. Deixar de ter medo do futuro e parar de se ligar no passado. É preciso tomar consciência do presente, como elemento de saúde espiritual. A propósito, foi dada a sugestão de que é relevante a gente tentar se estranhar. Imagine que você não é você. Tente visualizar você.
76. Para a reflexão sobre o quarto verbo (reconciliar), foi dito que ele é, em resumo, a tradução de todos os outros verbos vistos hoje. É fazer de novo o que os outros verbos nos sugeriram: é tentar outra vez – expandir, dialogar, entender/aprender. Convém lembrar, antes, de conciliar.
77. Foi sublinhado que só ama quem se entrega. A entrega é a natureza do amor. Deus nos amou porque se entregou e deu a vida por nós.
78. A Encíclica nos fala da entrega erótica, a entrega do corpo, envolvendo sensações humanas (eros). O texto desenvolve profundas reflexões sobre o amor ágape: entrega do afeto, fraterno, da amizade. Na parte final do texto, remete-nos para a discussão sobre a terceira grande dimensão da entrega: ação da entrega pelos mais necessitados, através da caridade.
79. A parte final do retiro, entre 17 e 17h30, foi utilizada para inúmeras perguntas e respostas, atendidas de forma profunda e iluminada pelo pregador, Pe. Rafael.
Brasília, 11/03/2007.
Antônio A. R. Veloso

sábado, 3 de março de 2007

Visita cordial do Arcebispo Dom João Braz de Aviz

A Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no Lago Sul de Brasília, viveu momentos de alegria, de cordialidade e de profunda reflexão com a visita espontânea que lhe proporcionou o Arcebispo Metropolitano de Brasília, Dom João Braz de Aviz, em 3 de março, último sábado, quando presidiu a celebração da missa de 18 horas, concelebrada pelo Pe. Abdon Guimarães, pároco, Pe. Júlio Negrizollo e Pe. João.
Delicadamente, o nosso arcebispo apresentou-se como convidado espontâneo, oferecendo-se para a celebração da Eucaristia no 2º domingo da Quaresma, guiado pela saudade de rever os paroquianos de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Em sua preciosa homilia de quinze minutos, Dom João de Aviz reportou-se inicialmente à orientação do Santo Padre Bento XVI, contida na citação de São João: “Hão de olhar para Aquele que transpassaram” (Jo, 19,37). Trata-se, na verdade, de um convite objetivo para todos nós: fixar o nosso olhar no Cristo crucificado. Ou seja, vivenciar a experiência de amor profundo de Deus por nós. São argumentos poderosos que nos convencem pela força do seu amor. Foi lembrado que o Papa Bento XVI tem desenvolvido importante esforço no sentido de nos mostrar que o amor humano, em que se busca estar próximo da pessoa amada, não se contrapõe ao amor divino, de autêntica doação: Deus nos ama com o amor que é ágape (doação) e com o amor que é eros (estar junto do amado). A Quaresma deve ser para nós o momento de reflexão para o grande jogo de amor com Deus. É importante e bom nos reconhecermos pecadores e saber que Deus nos ama tanto que nos transforma, nos converte. Nesse sentido, o jejum, a abstinência, a esmola, a oração mais prolongada, o amor fraterno – todos são instrumentos preciosos da quaresma para nos fortalecer e ajudar na nossa renovação.
1
Refletindo sobre a primeira leitura, do Livro do Gênesis (Gn 15, 5-12. 17-18), enalteceu Dom João de Aviz a figura extraordinária de Abrão, que vive da fé: vê-se a promessa de Deus na Aliança, com a entrega da terra por herança (braseiro e fogo como sinal da aliança) e a descendência numerosa. Foi assinalada a experiência de fé de Abrão como modelo para todos nós.
Na segunda leitura, da carta de São Paulo aos Filipenses (Fl 3, 17- 4, 1), nos é mostrado que não podemos nos comportar como “inimigos da cruz de Cristo”. É preciso nos mantermos na perseverança e na fé. Lembrou-nos Dom João de Aviz que os apóstolos, naquelas circunstâncias, iam passar por grande provação: eles iriam duvidar de Jesus e até mesmo renegá-lo. Jesus fez a escolha de três para ir à montanha – Pedro, João e Tiago –, a fim de mostrar-lhes a sua identidade divina. Deu-se então a conversa com Moisés e Elias. Na transfiguração, foi antecipado o momento crucial da paixão e morte de Jesus. É preciso deixar Deus trabalhar em nós, pois Ele sempre nos conduzirá para lugar seguro. Em síntese, feita a experiência de Deus (conversão para Deus) é importante que façamos a experiência com o irmão, isto é: precisamos trilhar um relacionamento novo, de fraternidade e partilha, serviço, amor.
Completando a reflexão, Dom João de Aviz referiu-se à Campanha da Fraternidade deste ano, especificamente voltada para a Amazônia: 23 milhões de pessoas, 163 povos indígenas com cerca de 208 mil índios. Cabe olhar com atenção para a realidade da região e, nesse sentido, devemos rezar pela Amazônia e apoiar o gesto concreto de ir até lá, o que se efetivará simbolicamente por grupo especial de 10 pessoas que sairão de Brasília até Roraima, devendo percorrer 300 km de rio, visitando cerca de 30 lugares, alguns distantes e isolados. Essa missão especial contará com a assistência de dois padres e presença diversificada de pessoas, inclusive mulher e jovem.
Concluindo, o arcebispo Metropolitano de Brasília, agradecendo pela acolhida, manifestou o desejo de que seja formado um só coração e que Deus abençoe a Quaresma e essa missão.

segunda-feira, 5 de junho de 2006

Curso: Estudo do “Pai-Nosso”

PARÓQUIA N. S. DO PERPÉTUO SOCORRO
Curso: Estudo do “Pai-Nosso”
Expositor: Prof. Paulo Ueti
(5 encontros)
Notas Avulsas
4º Encontro: 05/06/2006, 2.ª feira (16h12 às 17h57)
1. Após um profundo e consciente exercício de respiração, foram rezados o Pai Nosso e a Ave Maria.
2. Foi explicado que, na litrurgia, o Pai Nosso não se encerra com o amém logo após a expressão “mas livrai-nos do mal”. Acrescenta-se a isso: “vosso é o reino, o poder e a glória para sempre”, seguida do amém.
3. Foi dito ainda que o Pai Nosso ecumênico é colocado na segunda pessoa, mantida a forma “perdoai-nos aos nossas ofensas” e feito o acréscimo final indicado (“vosso é o reino, o poder e a glória para sempre, amém”).
4. O Prof. Paulo Ueti voltou a enfatizar que, na liturgia, o ofertório ocorre no momento da própria doxologia, quando se dá a oferta do próprio Cristo: é Ele que se oferece livremente para todos nós. O ofertório, após a consagração, está dentro do rito eucarístico.
5. Neste início de encontro, será visto o quarto pedido do Pai Nosso, que é o mais importante: “O pão nosso de cada dia dá-nos hoje”.
6. Por que é importante? É que a figura do pão como comida tem grande importância para todos nós. Na nossa vida, tem que ter pão, como meio para saciar a fome. Cerca de 80% da população do mundo passa pela situação de fome.
7. Toda religião tem a ver com a ordem do mundo, com o sentido de poder ajudar as pessoas a viver, ou seja, com comida e saúde do povo. O restante vem por acréscimo. Jesus usou o símbolo do pão, que alimenta fisicamente. Trata-se de comida de verdade, comida material, física. E isso é para ser dado hoje, e não amanhã (“o pão nosso de cada dia...”). É certo que não é somente a fome física, mas também a espiritual (“não só de pão vive o homem”). De toda maneira, é essencial saciar a nossa fome e das outras pessoas. Como, pois, colaboramos objetivamente para que as pessoas tenham comida, tenham possibilidade de viver? Como enfrentar a fome, fome real e objetiva? Como ajudar na solução do problema da gente pobre, necessitada, que precisa viver, saciar a fome?
8. O mundo não vive de abstrações. Jesus fez isso: curou a saúde das pessoas doentes, deu comida. Símbolo do Reino: banquete, com comida e bebidas. É preciso, pois, rever os nossos conceitos de saúde e de doença, sendo realistas e efetivos. Não podemos ser utópicos, imaginando que as pessoas sejam plenamente felizes ou plenamente infelizes. Está tudo ligado, embricado. É preciso colocar as coisas no contexto real e certo.
9. Só Deus é absoluto! Mais de 80% da prática médica não têm explicação estritamente científica. Nem tudo é tão absolutamente absoluto, certo ou errado. É preciso ver o contexto, avaliar, utilizar o bom senso. Na religião, é também fundamental usar o bom senso.
10. Anamnese: a expressão veio da saúde, significando fazer a memória da pessoa com quem se está lidando. Na religião, é relevante fazer as perguntas: quem é, de onde veio, como é a sua vida? É preciso perguntar pelo motivo das coisas; perceber a realidade das pessoas, qual é a fome das pessoas. É preciso relacionar-se com as pessoas e vê-las no contexto da sua efetiva realidade.
11. O quarto pedido do Pai Nosso, nessas condições, é a pergunta pela fome das pessoas, agora, hoje. Jesus não está preocupado diretamente com a religião, mas com a vida das pessoas. Jesus curou no sábado: não há dia para a doença e para o exercício da misericórdia.
12. A vida de Jesus tem a ver com o corpo das pessoas. Não cabe espiritualizar demais o quarto pedido do Pai Nosso: não se trata de hóstia ou outro simbolismo, mas de assegurar o pão material. Tem que dar o pão cotidiano, e dar para todos. Na última ceia, foi para Judas que Jesus deu o primeiro pedaço de pão. Não é só para os amigos, mas para todos, para todo o mundo.
13. Foi lembrado que Jesus, ao definir a missão, chamou os seus discípulos e os enviou para bem longe dele.
14. Houve, a propósito da vida de Jesus e de seus ensinamentos, ampla reflexão do Prof. Paulo Ueti e dos participantes sobre o importante diálogo entre Jesus e a mulher cananéia, conforme relatado por Mateus (15, 21-28):
“Jesus partindo dali, retirou-se para a região de Tiro e de Sidônia. E eis que uma mulher cananéia, daquela região, veio gritando: “Senhor, filho de Davi, tem compaixão de mim: a minha filha está horrivelmente endemoninhada”. Ele, porém, nada lhe respondeu. Então os seus discípulos se chegaram a ele e pediram-lhe: “Despede-a, porque vem gritando atrás de nós”. Jesus respondeu: “Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel.”
Mas ela, aproximando-se prostrou-se diante dele e pôs-se a rogar: “Senhor, socorre-me!” Ele tornou a responder: “Não fica bem tirar o pão dos filhos e atirá-lo aos cachorrinhos.” Ela insistiu: “Isso é verdade, Senhor, mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos!” Diante disso, Jesus lhe disse: “Mulher, grande é tua fé! Seja feito como queres! E a partir daquele momento sua filha ficou curada.”
15. Vê-se a profundidade do ora reproduzido diálogo: inicialmente, Jesus não se dispõe a dar o pão, ou seja, não se mobiliza para o apelo de atender à filha endemoninhada, sob o frio argumento: “Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel”. Diante da insistência da mulher estrangeira, explica: “Não fica bem tirar o pão dos filhos e atirá-los aos cachorrinhos”. A mulher não desiste e, corajosamente, insiste: é verdade, Jesus, mas você não tem controle sobre o pão a ser dado a todos, de modo que as migalhas sobram e os cachorrinhos comem os restos.
16. Observa-se que o jeito de Jesus atraiu a atenção da estrangeira: ela se prostrou diante de Jesus e fez o apelo. Os discípulos não colaboraram e , ao contrário, sugeriram que Jesus despedisse a mulher. O próprio Jesus se esquivou, como que querendo dizer que não veio para todos, mas apenas para o povo de Israel. Mais adiante, a ficha de Jesus caiu, pois a mulher revelou grande fé e estava pedindo pela saúde de sua filha (demônio é doença física e psíquica). A mulher, mesmo como estrangeira, estava querendo participar do processo de graça que Jesus estava propiciando. Por isso, a sua reação foi forte e muito tocante e Jesus reconheceu: “Mulher, grande é tua fé! Seja feito como queres!”
17. O Prof. Paulo Ueti assinalou que, na Igreja, somos diluídos e distorcidos, não oferecendo segurança psicológica e espiritual para as pessoas.
18. Voltando ao tema, enfatizou que o pão de que se trata é físico e relacional: é indispensável a convivência. Daí a beleza da interação que Jesus faz.
19. É importante indagar se o Pão Nosso de cada dia, que é também a eucaristia, ajuda a gente a sair de dentro de nós e conviver com os outros. É preciso nos movermos e nos comovermos com as pessoas.
20. Cada um de nós tem uma vocação diferente. O fundamental é ter em conta que o contato com as pessoas muda o nosso jeito e ensina a olhar diferente para as pessoas, para os pobres, para os necessitados. É preciso se envolver, diretamente ou apoiando quem dá conta de enfrentar o quadro de miséria e de necessidades do mundo. Isso ajuda a rever a nossa espiritualidade.
Intervalo: 17h17 às 17h36
21. Dando seguimento: “perdoai as nossas dívidas (ofensas), como nós perdoamos nossos devedores (quem nos ofendeu)”.
22. Perdoar: capacidade de exercer a misericórdia. O Pai Nosso assume que temos essa capacidade de perdoar, de exercer o perdão. Do jeito que perdoamos, pedimos a Deus que nos perdoe.
23. A pergunta é: “nós, de fato, aprendemos a perdoar?” O importante é saber que o perdão é via de mão dupla: primeiramente, o perdão é para mim; depois é que vai para o outro (o que está dentro sai para fora). Jesus: o que traz impureza, o que impurifica é o que sai de dentro.
24. A nossa capacidade de perdão (que reconcilia) existe? O perdão tem que ser explícito: tenho que pedir desculpa ou dizer que não fiquei satisfeito. O perdão é, assim, fundamental e problemático. Vai depender fortemente do processo de auto-conhecimento, que significa percorrer um caminho difícil e profundo, na busca de saber para onde estamos indo. O processo de reconciliação exigirá que eu examine por que fiquei chateado. Exercício de auto-conhecimento. Isso tudo precisa ser verbalizado. É preciso buscar a base da reconciliação. O perdão vai ser um caminho de mão dupla.
25. O problema somos nós: “como nós perdoamos os nossos devedores?” É falácia ou verdade? Eu tenho que dizer que perdôo, eu tenho que me mudar.
26. Encerrando o encontro, o Prof. Paulo Ueti recomendou a leitura de livro de autoria do monge beneditino, Anselm Grün, sobre os ritos da purificação, relacionados com a questão do perdão.
Brasília, 05/06/2006

segunda-feira, 29 de maio de 2006

Curso: Estudo do “Pai-Nosso”

PARÓQUIA N. S. DO PERPÉTUO SOCORRO
Curso: Estudo do “Pai-Nosso”
Expositor: Prof. Paulo Ueti
(5 encontros)
Notas Avulsas
3º Encontro: 29/05/2006, 2.ª feira (16h10 às 18h)
1. O encontro foi iniciado com a leitura do Salmo 131 (130):
“Javé, meu coração não se eleva,
nem meus olhos se alteiam;
não ando atrás de grandezas,
nem de maravilhas que me ultrapassam.
Não! Fiz calar e repousar meus desejos,
como criança desmamada no colo de sua mãe,
como criança desmamada estão em mim meus desejos.
Israel, põe tua esperança em Javé,
desde agora e para sempre.”
2. O Salmo 131 é o salmo da peregrinação, rezado nas romarias, na subida a Jerusalém. Mostra a necessidade de que cada um de nós seja como uma criança. É preciso assumir o espírito de criança que clama pelo Pai, à semelhança do que se faz na oração do Pai Nosso, oração comunitária, em que toda a humanidade se dirige ao Deus Pai.
3. O primeiro passo no nosso caminho espiritual é saber a quem se dirige o pedido. Quem é o Deus a quem estou me dirigindo? “Eu sou o Deus que te tirou do deserto, da escravidão do Egito”.
4. A oração do Pai Nosso mostra que não cabe privatizar Deus, aprisioná-lo, determinar as coisas em relação a Deus. É fundamental descobrir quem é Deus e saber que Deus é Pai, é de todos, mesmo daquele que não quer.
5. “Pai Nosso que estás nos céus”. Deus não está só aqui na terra, mas em todo lugar. Ninguém é capaz de dizer o que são realmente os céus. Quando se está zangado, bravo com o filho, por exemplo, a reação é chamá-lo pelo nome, de tal modo que a pessoa fica controlada, presta atenção em você. O judeu não chama o nome de Deus em vão: “Eu sou”. Jesus: “Eu sou salva”. Quando a gente é “eu sou salva”, está integrado, está controlado. Não se pode, pois, dizer o nome de Deus em vão, pois seria mentir para si mesmo.
6. Temos, assim, uma pergunta que é eterna para nós: “quem sou eu?” Jesus chama Deus de Pai, paizinho. Quer dizer: ternura, amor, proteção. Em aramaico, melhor seria dizer que Deus é mãe. Na nossa sociedade, pai é normalmente uma figura opressora. De qualquer forma, é preciso ter em conta que Deus é o Pai. O nosso Pai, o Pai de todos nós.
7. O primeiro pedido explicitado na oração do Pai Nosso é: “santificado seja o teu nome”. Deus é santo. A súplica é para que Ele seja glorificado (manifestado). Para que o nome de Deus seja manifesto, presente no mundo.
8. Como foi dito antes, o Pai Nosso é oração comunitária, não privada. O primeiro pedido tem a ver com “não dizer o santo nome de Deus em vão”. Ou seja: não colocar o nome de Deus naquilo que Ele não gosta. Não usar Deus, por exemplo, como instrumento de castigo. Por outras palavras, é não fazer de Deus o que Ele não é. Devemos ser mais fiéis à essência do que Deus é.
9. O pedido do Pai Nosso, pois, é para que o nome de Deus seja manifesto. O sentimento que caracteriza Deus é a misericórdia, o amor. Glorificá-lo é reconhecer essa condição. É preciso que a misericórdia de Deus seja manifestada.
10. Quem é responsável pela misericórdia de Deus? Nós, através do nosso testemunho. Temos que testemunhar o amor de Deus. Onde as pessoas encontram Deus? Onde são bem acolhidas. A questão central é, pois, a hospitalidade. Isso depende de nós, do nosso corpo, do nosso movimento, da nossa atitude.
11. O segundo pedido do Pai Nosso é: “venha a nós o teu Reino”. Pedido destinado a todos, para o mundo. Trata-se de novo mundo, nova ordem. Outro ponto fundamental: o teu Reino, o Reino de Deus – o Reino que é novo, que precisa ser ajudado a construir por nós. Isso tem a ver com o jeito de viver a sua vida: o Reino de Deus acontece quando a minha vida se parece com a vida de Jesus. Para isso, eu preciso conhecer Jesus. Fazer o encontro pessoal com Jesus, o que pode ser feito através da Bíblia, da Igreja, da comunidade. É preciso fazer o pedido para que o Reino venha todos os dias. E ele vem quando me disponho a fazer as coisas acontecerem. Deus quis assim: depender de nós para a construção do Reino.
12. É preciso não confundir o Reino com a salvação final. A nossa salvação começa aqui com o Reino, que precisa da nossa ação, precisa ser construído por nós. Recorde-se que no capítulo das bem-aventuranças é dito que o Reino está no meio de nós. No fim, vamos ter a plenitude da salvação, que depende de Deus.
13. O terceiro pedido do Pai Nosso diz: “seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”. Quanto à primeira parte, é difícil saber qual é a vontade de Deus. Eu preciso me comprometer com ela. Toda a oração do Pai Nosso desenvolve um compromisso comunitário.
14. Quem me ajuda a saber o que é certo, o que é a vontade de Deus? É a comunidade! Fazer tudo junto, em comunhão: esse é o caminho do discernimento. É preciso discernir.
15. O desejo de Deus sempre nos leva para o equilíbrio, que não é pacífico, é conflituoso. O equilíbrio dói, é difícil, não é tranqüilo. O deserto nos ajuda a manter o equilíbrio.
16. Foi lembrada a passagem da angústia de Jesus: “Pai, afasta de mim esse cálice, mas não seja feita a minha vontade e sim a tua vontade”. Escutar e fazer (obediência), mesmo que isso signifique perdas para nós. Foi também recordado o episódio do deserto com o diálogo entre Deus e Moisés: Deus manda Moisés falar com o Faraó e Moisés resiste, querendo a garantia de saber que tudo vai ser cumprido. E Deus responde a Moisés: “quando todos tiverem saído do Egito e estiverem fora, bem longe do Egito, vocês vão saber que eu estava do lado de vocês”. É preciso fazer para saber. O caminho é contruído no dia-a-dia, nas ações e atitudes:
“Caminheiro, você sabe: não existe caminho; passo a passo, pouco a pouco, o caminho se faz”.
17. A tarefa é árdua. É cansativo. É preciso refletir, avaliar. É conflitivo. Isso se chama método, caminho. É preciso aprender com o método.
18. Fazer a vontade de Deus exige de nós perguntar, ouvir, saber qual é a vontade de Deus. É preciso viver a crise e discernir.
19. O Prof. Paulo Ueti assinalou, para os fins de evangelização, que falta na Igreja a prática do Ministério da Escuta. Escutar com fé, com liberdade, o que as pessoas têm a dizer para nós.
Intervalo: 17h15 às 17h35
20. Continuando a reflexão sobre o terceiro pedido do Pai Nosso, foram desenvolvidos alguns comentários sobre a parte final: “assim na terra, como no céu.” Está por trás o fato de que o Reino de Deus, que está no céu, precisa acontecer aqui na terra. O jeito que a gente vive aqui na terra precisa ser cada vez mais parecido com o jeito do céu. A terra tem que ser igual ao céu: o céu se incorpora à terra.
21. O céu começa aqui, entre nós, conforme diz Anselm Grün. A glória de Deus começa no céu e se espalha na terra. As coisas se misturam. Na descrição do Apocalipse, o céu e a terra se juntaram. Está tudo junto. A terra tem que ser espelho do céu. Quando acontecer a plenitude em tudo, a fé não será mais necessária. Até lá, a fé é essencial. Por enquanto, precisamos da fé e da militância.
22. O céu é o lugar onde Deus habita. Deus se encarnou. A imagem que eu tenho é que Deus quer a minha participação para viver na terra um pedaço do céu, tornando o céu uma realidade.
23. Diferentemente de generosidade, que é um gesto isolado, a caridade exige que a pessoa se envolva, se comprometa. Precisamos ser cada vez mais caridade, que exige comprometimento e conversão. Nós fazemos muitas vezes coisas erradas. É preciso encontrar caminhos coletivos.
24. Na vida eclesial, a busca dos caminhos é mais difícil, mais tormentosa do que em nossa casa. São vividas crises e mais crises, difíceis de administrar. Nós não conseguimos ser irmãos, fraternos.
25. A vontade de Deus precisa encher a terra, ser objetiva, voltada para o dia-a-dia. Tudo isso exige freqüentar o deserto e encontrar Deus, ver os nossos limites, as nossas fraquezas. É preciso chegar até o deserto, lugar onde nos dispomos a silenciar e encontrar Deus. É preciso fazer o encontro e ouvir. Chegar ao discernimento.
26. O Prof. Paulo Ueti referiu-se à passagem em que Elias foge para o deserto para pedir ajuda a Deus e se esconde em uma gruta. A cada tormenta – furacão, terremoto, fogo – Elias aparecia e procurava Deus e Ele não estava ali. Passou uma leve brisa e Elias não percebeu que ali estava Deus. (1 Reis, 19).
27. O ponto focal de tudo é que temos um problema com a imagem que se tem de Deus. Onde encontramos Deus ou onde não o encontramos? É só lembrar a parábola das virgens para perceber que não se pode dormir. Lerdeza no Reino de Deus não funciona. O Reino de Deus é daqueles que estão antenados, ligados, vigilantes. É preciso velar, vigiar, estar sempre atento. Não deixar as oportunidades passarem. Em síntese: estar atentos para as oportunidades e fazer o nome de Deus estar presente.
Brasília, 29/05/2006.

segunda-feira, 8 de maio de 2006

Curso: Estudo do “Pai-Nosso” 1º Encontro

PARÓQUIA N. S. DO PERPÉTUO SOCORRO

Curso: Estudo do “Pai-Nosso”
Expositor: Prof. Paulo Ueti
(5 encontros)

Notas Avulsas


1º Encontro: 08/05/2006, 2ª feira (16h17 às 18h)

1. O Prof. Paulo Ueti manifestou o desejo de começar o curso rezando, o que foi feito com a participação de todos na leitura do Salmo 27 (26):

“Javé é minha luz e minha salvação: de quem terei medo?
Javé é a fortaleza de minha vida: frente a quem tremerei?
Quando os malfeitores avançam contra mim para devorar minha carne, são eles, meus adversários e meus inimigos, que tropeçam e caem.
Ainda que um exército acampe contra mim, meu coração não temerá;
Ainda que uma guerra estoure contra mim, mesmo assim estarei confiante.
Uma coisa peço a Javé, a coisa que procuro: é habitar na casa de Javé todos os dias de minha vida, para gozar a doçura de Javé e meditar no seu templo. Pois ele me oculta na sua cabana no dia da infelicidade; ele me esconde no segredo de sua tenda, e me eleva sobre uma rocha.
Agora minha cabeça se ergue sobre os inimigos que me cercam; sacrificarei em sua tenda sacrifícios de aclamação.
Cantarei, tocarei em honra de Javé!
Ouve, Javé, meu grito de apelo, e tem piedade de mim, e responde-me!
Meu coração diz a teu respeito: “Procura sua face!”
É tua face, Javé, que eu procuro, não me escondas a tua face.
Não afastes teu servo com ira, tu és o meu socorro!
Não me deixes, não me abandones, meu Deus salvador!
Meu pai e minha mãe me abandonaram, mas Javé me acolhe!
Ensina-me o teu caminho, Javé!
Guia-me por vereda plana por causa daqueles que me espreitam;
Não me entregues à vontade dos meus adversários, pois contra mim se levantaram falsas testemunhas, respirando violência.
Eu creio que verei a bondade de Javé na terra dos vivos.
Espera em Javé, sê firme!
Fortalece teu coração e espera em Javé!”


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2. O Salmo 27 é texto tipicamente pascal e nos transmite o ensinamento de que Deus é a nossa luz, a nossa salvação. Não devemos ter medo de ninguém e de nada. “Não tenhais medo!” Não é para ter medo e nem colocar medo em ninguém: o Senhor é a rocha, o Senhor é a salvação, o Senhor é o abrigo, o Senhor é a fortaleza, o Senhor é a luz. São Paulo: “Nada pode nos separar do amor de Cristo.” É importante, também, não separarmos ninguém do amor de Cristo. Não devemos cometer o erro de imaginar que o Cristo é só nosso, nos pertence. Foi lembrado o episódio de Maria Madalena com o Cristo ressuscitado, em que Jesus disse: “Não me retenha, não me agarre.”

3. Não é possível apropriar-nos de Deus. Ele não é minha propriedade. No máximo, estará a nosso alcance fazer alguém reconhecer Jesus.

4. Lucas (11,1): “Senhor, ensina-nos a orar, como João ensinou a seus discípulos”. Há dois textos do Pai Nosso, um de S. Lucas, mais breve e com cinco pedidos, e outro de S. Mateus, em versão mais ampla, com sete pedidos. A idéia do curso é examinar os dois textos, refletir sobre eles e avaliar as diferenças.

5. O Prof. Paulo Ueti indicou, a propósito, as seguintes leituras:

a) “Pai-Nosso - Oração da Utopia”, de Evaristo Martin Nieto (Ed. Paulinas);
b) “Bem-Aventuranças e Pai Nosso”, de Jean Ives Leloup (Ed. Vozes).

6. Durante o curso, haverá um retorno ao ambiente de oração, no caso uma oração específica, o Pai Nosso, ensinada pelo próprio Jesus.

7. O ponto central é o de examinar como olhar para a vida, para a nossa história, de uma maneira toda especial, de uma maneira orante. É preciso ter em conta que a oração pode ser muita coisa. É preciso saber distinguir, por exemplo, entre cristão e crístico. Nós somos cristãos, vivemos uma realidade cristã. Em nossa caminhada, queremos ser cada vez mais crísticos: parecer mais e mais com Cristo. Diferentemente, Ghandi não era cristão, não quis ser cristão, mas tinha a vivência de uma realidade crística.

8. A nossa vida precisa ser orante. Oração: tem a ver com falar, verbalizar. Na nossa tradição religiosa, porém, é mais do que isso, é mais que a palavra, que já é algo poderoso (a palavra cria a realidade). A oração vai além e tem a ver com diálogo (dia: diversos sentidos, querendo dizer através; logos: palavra). Diálogo: através da palavra, por meio dela e para além dela.

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9. Diálogo não é, pois, apenas troca de códigos. Precisa do silêncio, para também escutar e deixar falar. Oração é, necessariamente, um encontro, em que se vai além da nossa palavra. Trata-se de encontro na relação: é possível gerar conversão, mudança. O diálogo é vivificador, transforma, muda, é conversão. O diálogo pressupõe disposição e desapego, para que haja a transformação.

10. Oração não é, assim, uma simples lista de pedidos. O diálogo representa um encontro, sempre vai ser uma educação, um processo de discernimento, que tira de você para fora. Através das palavras, a pessoa precisa botar para fora, abrir-se, dizer, expor-se.

11. Todo encontro é uma experiência de meditação, de contemplação. A sua realização muda a nossa teoria. Dialogar (até o fim) é uma tarefa muito difícil. A oração nunca é a mesma palavra, no mesmo lugar, no mesmo ritmo.

12. Num dado momento, os discípulos pediram a Jesus que os ensinasse a orar. O Pai Nosso não é repetição daquelas mesmas palavras: é um encontro com Deus. Como se faz esse encontro? Como se faz o meu acesso a Deus?

13. Isso só ocorre quando a gente realiza o encontro consigo mesmo, com os irmãos e com Deus. É preciso entrar no processo do mistério: é comunhão. A oração é sempre comunicativa, relação comunitária, comunhão. Através da palavra, encontro Deus.

14. Muita gente acha que a Igreja é o mesmo que supermercado, local de negócios, balcão de consumo. Somos bons negociadores, mas nem sempre conseguimos fazer encontros verdadeiros, em que nos apresentamos tal como realmente somos, com as faltas e virtudes, retiradas as nossas máscaras.

15. A oração é fundamental: tem que ser algo que seja estruturante da nossa vida. É mais do que apenas fazer ritos. O rito é importante, mas é preciso ir além para realizar o verdadeiro encontro, atendendo a requisitos essenciais:

a) realizando o encontro comigo mesmo, descobrindo e revelando quem eu sou, com os meus limites e qualidades;

b) fazendo esse encontro também com o outro, que vai me ajudar a me descobrir, a me conhecer melhor.


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16. É preciso saber distinguir claramente: quem são os amantes e entes queridos; os amigos; os cúmplices. Na Igreja, precisamos viver relações de conspiração, respirar o mesmo ar e ter os mesmos objetivos. É questão de cumplicidade: ter a mesma disposição de caminhar juntos, mesmo que não haja relação de amizade, de amor, de paixão.


Intervalo: 17h15 às 17h33.


17. Foi dito, no retorno, que na convivência de uma comunidade nem todas as pessoas são amigas. É preciso, nesse contexto, estabelecer certo nível de cumplicidade, de conspiração, a fim de dar curso e, juntos, seguir o caminho.

18. Respondendo a indagação feita, o Prof. Paulo Ueti enfatizou que encontro não é só fala, louvor. Referiu-se ao livro do monge beneditino Beda Griffits, intitulado “Retorno ao Centro”, para dizer que viemos de Deus e para Deus somos vocacionados. É indispensável que eu me dê conta disso: a partir daí, ninguém me separa de Deus.

19. De fato, são vários os estágios que devo percorrer, na economia da salvação. Entre eles, há o processo da catarse (dizer, dizer, dizer), mas até aí não se trata de encontro completo e verdadeiro. É preciso ir adiante, saber escutar, dar-se conta de si mesmo. Voltar ao centro: movimento de escutar a si mesmo. Silenciar e escutar. Tomar pé da situação. É no silêncio que me encontro comigo mesmo, por isso não posso ter medo do silêncio, da escuridão, da noite. No "retorno ao centro", por meio do encontro comigo mesmo, encontro a Deus.

20. Deus não interfere diretamente na vida das pessoas. Ele quis que nós nos envolvêssemos. Quando nos envolvemos, escutamos Deus.

21. Precisamos de tempo especial, precisamos de atender à liturgia. Exemplos: celebrar aniversário, cuidar de alguém doente. Ou seja, precisamos desse momento especial a ser observado.

22. Encerrando o encontro, foi mencionado que da próxima vez serão vistos os textos do Pai Nosso.


Brasília, 09/05/2006.